Zé do Fumo


Em uma pequena cidade incrustada no interior de Goiás vivia um homem muito simples, mas querido pela população, por sua honestidade e bom humor. Ele vestia sempre camisas de chita com estampado xadrez, calças de algodão brancas ou caquis, alpercatas de couro e um velho e amarrotado chapéu de palha. Ninguém sabia o seu nome, pois todos o chamavam de Zé do Fumo, devido a ele ter uma banca no mercado onde vendia fumo em rolo e palha para cigarros, como ainda é hábito em algumas cidades interioranas.

Nos fins de semana, quando não abria a sua banca, Zé do Fumo andava pela cidade visitando os amigos. Sentava no banco da Pharmácia Santa Therezinha e, enquanto picava o fumo para mais um cigarro, contava e ouvia "causos", piadas e novidades, em uma época em que não havia jornal nem televisão naquele rincão sertanejo.

O que ninguém sabia era que Zé do Fumo, que ficou viúvo aos cinquenta anos de idade, gostava de conquistar mulheres casadas e com elas manter romances quentíssimos e muito discretos, para evitar que os maridos das mesmas tomassem conhecimento das aventuras e tentassem alguma desforra ou vingança violenta.

Sei que é difícil imaginar uma pessoa tão simples no papel de um Casanova, mas Zé do Fumo, apesar de muito humilde, era simpático, muito higiênico e sabia, como poucos, como agradar uma mulher, especialmente as mulheres casadas, cujos maridos há muito tempo não cumpriam com seus deveres, relegando as esposas ao esquecimento e a uma vida de muito trabalho e nenhum amor ou carinho.

O pior é que, graças à sua discrição e apetite sexual, ele podia manter vários relacionamentos simultâneos sem que ninguém suspeitasse de nada e até concluíssem que ele já não se interessasse por mulheres. Entre seus vizinhos de banca do mercado havia o Zeca, homem de cerca de quarenta anos de idade, de físico avantajado, típico machão, que vivia se vangloriando de suas conquistas e acusando o Zé do Fumo de ter perdido o interesse no sexo oposto. O Zé não reagia, apenas sorria...

Um dia uma notícia entristeceu a cidade, Zé do Fumo havia morrido "de repente". Naquela época quando não se sabia a causa da morte usava-se esse termo. Foi uma tristeza geral, a maioria dos cidadãos foi para casa para se preparar para o velório. A pequena casa de Zé do Fumo ficou cheia de pessoas, que se esparramavam pelas salas, quartos e calçada. Entre os presentes estava o Zeca com sua família, como sempre muito falante, contando vantagens, falando mal do falecido e, com isto, desagradando às muitas mulheres, ex-amantes, presentes ao concorrido velório. Uma hora, não suportando mais aquela situação e embalada pela cachaça ali servida, a mulher do Zeca gritou: - Chega! Cala essa boca, seu idiota, porque poucas foram as mulheres aqui presentes que não dividiram seu leito com o Zé do Fumo, inclusive eu! E você conta tanta vantagem, mas só fui feliz ao lado do Zé do Fumo!

O silêncio e o constrangimento foram absolutos, ninguém conseguiu esboçar uma reação sequer, nem naquele momento nem depois. Os maridos traídos concluíram que o melhor era deixar como estava e fazer de conta que aquilo nunca acontecera. Mas o nome Zé do Fumo ficou definitivamente proibido nas rodas masculinas e venerado nas rodas femininas daquela pequena cidade.

A vida continuava e a impressão que se tinha era de que nada havia acontecido de anormal, o Zeca agora era um sujeito caladão, que andava olhando para o chão e não contava mais vantagens. Tudo parecia esquecido e relegado ao passado, mas um detalhe não deixava ninguém esquecer do Zé do Fumo: No Cemitério Municipal, que ficava dentro da cidade, o túmulo dele era o mais bem cuidado, onde nunca faltavam visitas, flores, velas e orações...


Lupércio Mundim


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